segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Polaroid, em tons de negro

Rua do Ouro, de óculos escuros
Um homem persegue a berma
Agarra-se à confiança na bendita
O estalido seco da bengala afasta os demais
Como se ao evitá-lo fugissem à realidade
O sinal fica vermelho, sabe-o
E tem que ser o primeiro a partir
Porque no verde a multidão cega e engole os mais fracos.

Cheira-se o Tejo, ao longe
Novo cruzamento, onde está um homem-estátua
Que não vê e passa-lhe ao lado
Dois japoneses tiram um retrato junto ao D. José
Observam a sua destreza e seguem fotografando.
Para onde vai? diz-lhe uma senhora
Que lhe dá o braço e atravessa a última estrada que o separa do mar
Do outro lado, afasta-se sem despedidas
O homem, acostumado, também não agradece
A vida em tom escuro apagou-lhe o sorriso

Num banco de pedra sonha com o mar,
Que nunca lhe contaram.
E sonha-se gaivota que nunca viu voar
Ouve o grito dum barco
Que lhe vibra corpo adentro.

Mas não grita.

Se ao menos pudesse chorar…
Soltaria num lamento
Que um homem sem sentidos
Também tem sentimento.

Mas não chora.

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