quarta-feira, 23 de julho de 2008

O costume, se faz favor

O costume, se faz favor

Que é feito dos serões ao luar
Ébrias noites, cantorias,
Fado familiar
Risadas genuínas

Um petisco a degustar
Provas de sabedoria
Adormecer com o dia
E com a noite acordar

O tempo segue a correr
Inconsciente, acompanho
Como se fosse a viver

Agora, na minha cama
Contento-me em reviver
As nossas noites em Alfama

euforia


a galope vem
na crista da onda

é espuma salgada,
fantasia

é livre, louco
longo o percurso
perfume de maresia

ebrio,
corre
em passos curtos,
soltos
tropeça, cai
rebola, salta
solta um sorriso
grita
chora, berra

borbulhando
pousa docemente
na areia

ansioso
por voltar

quarta-feira, 16 de julho de 2008

O último voo




Atravessar as nuvens frias
Planar sobre o trigo, como gaivota no mar
Percorrer os montes, as aldeias vazias,
Montanhas nos horizontes
Trazer no bolso cal e não parar de sonhar.
Uma velha, em tons de negro passava na rua.
Tão branca era a rua,
Tão negra era a velha
Que podia vê-la a qualquer distância…
Recordações de infância?
Cheirar as estevas, o estrume
Que somos nós, também.
Porque estamos nós tão sós
No meio de tanta gente
Sempre buscando por alguém?
Regresso a mim e ao meu caminho
Desvio-me de um sobreiro
Docemente curvado, castanho.
Um cuco, por companheiro…
Nada teme, sozinho?
Passa um cão, pastor, rafeiro
Um homem, um rapaz, vacas e bois
Buscam por água, um lameiro
O que encontrarem primeiro.
Um e um será sempre dois…
Avisto a igreja, vestida a rigor
Rosto branco, fresca nas arcadas
Melancólica, afasta o calor.
Refresco-me na sombra
Dou meia volta e prossigo
Subo com vigor, no campo
E deixo-me pairar, sobre as casas
Com o mais doce bater de asas
Eterno…infinito, amplo.

No último riso do sol,
Volto para o meu lugar
O sítio a que pertenço.
Aterro primeiro num cipreste
A terra é pouso agreste,
E penso

Que assim,
Assim é que é voar.

sábado, 12 de julho de 2008

Maioridade

Maioridade

O moço de tenis brancos
Que assobiava aos passaros
E jogava ao berlinde
Com as mãos na terra
E os joelhos vincados.
Vive agora numa cave
Com TV por cabo.
Janta bolas de berlim
E bebe vinho de pacote.
Devora um jornal antigo
Esquecido nas Mercês.
É caixa num Cash and Carry
Desses numa garagem,
Donde sai para fumar.
Houve até um ano,
Em que na Páscoa,
foi à terra.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Parabéns a um amigo

No seu cabelo traz o pó
Que à força do calor,
Exigiu na terra de Florbela.

A força do trabalho
Adivinha-se
Em sulcos já vincados
De alegria,
Donde, ligeira,
Corre uma gota de suor.

Não lamenta a vida
Nem os outros
E segue
Sorrindo,

Em frente…

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Meio púrpura


Procura-me o entardecer,
vazio e escuro.
Magnetizado,
Luto, esbracejo, desisto e fujo.
Sobrevivo e volto, amiude.
Nas sombras púrpuras convivo,
A medo.

Quem me dera fosse luz, o novo dia.


Não vejo o mar azul, o céu infinito,
Não saboreio o mel.
Nenhum corpo é doce,
nem nenhum é meu.

No meu caderno escrevo
Alegria
Para não esquecer o alfabeto.

Marco a cadência e inspiro
e expiro.

Vou entrançando o tédio,
Fio a fio, com precisão,
que o tempo, esse existe.
Poderosas cordas
Que aguardam o momento,
a oportunidade,
de agarrar...
sei lá o quê.

Quem me dera fosse luz, o novo dia,
Que a noite, nem vê-la.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

O grito


Gritava no deserto
Gritava no mar calmo e aberto
Na auto-estrada vazia.

Na troposfera bulia
o grito do miserável
quando em gritos de agonia.

Ira, ódio, horror,
não conhecera o amor.
Apenas aquela gritaria
lhe alimentava a alma
sempre vazia.

E gritava...